sexta-feira, 27 de junho de 2014

Reforma do IRS: o que se pode ou deve esperar?

No seu habitual editorial do Metal, Aníbal Campos, Presidente da AIMMAP faz a reflexão que se impõe: o que se pode esperar desta importante reforma, num quadro de expectativas e sentimentos contraditórios?
Se por um lado sonhar com uma descida das taxas e consequente desagravamento fiscal, faz parte do que comanda a vida, por outro o histórico das políticas de austeridade deste governo logo nos chama à dura realidade dos cortes salariais e aumento de impostos. O que esperar então?
Para as empresas o essencial da reforma residirá na redução da complexidade fiscal e na dinamização da economia, sendo esta a prioridade.
Se virmos o exemplo espanhol, com uma proposta de redução do IRS e do IRC como forma de dinamização do mercado interno, facilmente se compreende que há quem acredite que o desagravamento fiscal pode dar um enorme contributo ao crescimento.
A AIMMAP tem esperança mas que sentido faz estar agora a alterar o IRS se não for para tratar daquilo em que esse imposto é actualmente mais perverso?
Veja o editorial de Aníbal Campos aqui

"A reforma do IRS

O governo está a preparar uma reforma do IRS, tendo aliás sido já nomeada uma comissão para trabalhar o assunto.
Sinceramente, esta notícia faz despertar expectativas e sentimentos contraditórios.
Perante o anúncio de uma reforma do IRS, somos levados a sonhar com uma descida das taxas aplicáveis e com um verdadeiro desagravamento da carga fiscal que tanto tem sobrecarregado as famílias portuguesas. Esse seria aliás o corolário lógico de qualquer reforma fiscal.
Porém, com o histórico de políticas de austeridade deste governo – que no essencial têm passado por cortes salariais e aumentos dos impostos -, logo somos feitos regressar à terra e quase deixar de acreditar nessa ilusão.
Apesar de tudo não nos demitimos de sublinhar o nosso entendimento.
Ora, na perspetiva das empresas, uma reforma do IRS no contexto atual, para que pudesse ser consequente, teria de dar resposta a duas questões essenciais. Em primeiro lugar, reduzir a complexidade fiscal. Em segundo lugar contribuir para dinamizar a economia.
Relativamente à primeira questão, não temos quaisquer dúvidas de que uma maior simplificação conduzirá a menor burocracia, diminuição dos níveis de fraude e evasão fiscais e seguramente maior eficiência. Para além disso, permitiria certamente uma mais eficaz afetação dos recursos humanos da administração fiscal. O que seria pelo menos um pequeno passo na tão ansiada reforma do Estado.
Em todo o caso, para as empresas a segunda questão é seguramente a mais importante. E quanto a essa também não temos dúvidas. A dinamização da economia terá de passar por maior consumo e por empresas mais competitivas. E ambos os objetivos serão indubitavelmente potenciados por uma diminuição dos impostos cobrados aos contribuintes.
Se o IRS baixar, as famílias poderão consumir mais e dessa forma fazer aumentar a atividade das empresas que trabalham essencialmente para o mercado interno, as quais continuam a ser a maioria das que existem em Portugal. Com maior atividade, aumentará o emprego e também a receita fiscal em sede de IRC e de IVA.
Aqui ao lado, o governo espanhol prepara-se para implementar uma descida do IRS e do IRC. Os nossos vizinhos, apesar das dificuldades com que se confrontam – que são em muito semelhantes às que se verificam em Portugal -, acreditam nesta espiral virtuosa, estando convictos de que o desagravamento fiscal potenciará um aumento da receita fiscal e uma diminuição dos encargos sociais. Seguir os bons ventos que nessa matéria parecem soprar de Espanha seria uma medida de elementar competência.
Esse desagravamento em sede de IRS teria um outro efeito positivo na competitividade das empresas, visto que contribuiria seguramente para a fixação de massa cinzenta em Portugal. Na verdade, como é sabido, a carga fiscal que esmaga os trabalhadores portugueses está a provocar uma verdadeira fuga para a emigração, dos trabalhadores mais qualificados e também dos nossos universitários com melhor formação.
Esses quadros são indispensáveis para que as empresas portuguesas possam apostar em fatores que as diferenciem da concorrência nos mercados globais, nomeadamente em Inovação.
Pelo que se queremos criar condições para que eles se fixem em Portugal, teremos obviamente de ser fiscalmente competitivos também nesse domínio.
Muitos dos nossos melhores estão a ser empurrados do país em resultado exclusivo das elevadas taxas de IRS que o Estado português lhes aplica. Não ter consciência de que isso está a empobrecer a nossa economia é por si só um sinal de alguma leviandade.
Embora sem grande convicção, confesso ainda assim que vou manter a esperança de que o governo português consiga por uma vez surpreender-nos positivamente. Afinal de contas, sejamos lógicos: que sentido faz estar agora a alterar o IRS se não for para tratar daquilo em que esse imposto é atualmente mais perverso?
Aníbal Campos
Presidente da Direção da AIMMAP "