terça-feira, 4 de agosto de 2009

Clima anti-empresarial

No editorial de “Metal”, publicado como suplemento do jornal “Vida Económica”, na edição de 31 de Julho, o Presidente da Direcção da AIMMAP manifestou-se contra o clima anti-empresarial que alguns sectores da sociedade portuguesa insistem em alimentar.

Considerando a importância e a actualidade da matéria, transcreve-se nas linhas subsequentes o texto correspondente ao referido editorial.

"A caça aos patrões

Recentemente, num programa televisivo em que participei, tive oportunidade de citar alguém que dizia que, às vezes, a ideia com que ficamos em Portugal é a de que em 1974 começou uma verdadeira caça aos patrões que ainda não terminou.
Com efeito, as empresas portuguesas e quem as dirige continuam a ser verdadeiramente estigmatizadas pelos sectores mais folclóricos e ruidosos da sociedade, os quais gostam de tratar os empresários e os gestores em geral como pessoas dignas de pouca confiança
Todos sabemos que, no seu conjunto, esses sectores correspondem a uma minoria da sociedade portuguesa. Porém, dado o espalhafato e mesmo o acinte com que insistem em manifestar-se, abafam sistematicamente todas as opiniões em contrário e fazem prevalecer esse clima anti-empresarial de que todos nos vamos dando conta.
Como todos os mais lúcidos não se cansam de repetir, essa postura é manifestamente negativa para os legítimos interesses dos cidadãos portugueses.
Não há alternativas: apenas poderá haver produção de riqueza para o país se houver empreendedores que criem emprego, investindo e arriscando o respectivo património.
Nesse sentido, estarão profundamente iludidos todos aqueles que suponham poder-se combater os efeitos da crise em que vivemos num ambiente de crispação contra os empresários e os gestores.
Sem empreendedores não poderá haver empresas; e sem empresas não haverá emprego.
Pelo que, naturalmente, ao invés do que pretendem sustentar alguns irresponsáveis que jamais fizeram a ideia do que é gerir uma empresa, caso se pretenda fomentar o emprego em Portugal, haverá antes de mais nada que promover o empreendedorismo.
Este editorial do “Metal” é o último que terei oportunidade de ver impresso em letra de jornal antes das eleições legislativas que terão lugar no final do próximo mês de Setembro.
Pelo que não posso deixar de expressar agora os nossos votos de que, seja qual for o resultado eleitoral, o governo que vier a resultar dessas eleições tenha bem presente aquela ideia. E que, de uma vez por todas, saiba acarinhar as empresas portuguesas e incrementar sem preconceitos a capacidade empreendedora dos portugueses que continuam dispostos a arriscar o seu próprio património para gerar emprego e criar riqueza para o país. Acabando definitivamente com esta lógica néscia de caça aos patrões.
António Saraiva
Presidente da Direcção da AIMMAP"

Entrevista ao Director Geral da AIMMAP

Na edição de “Metal” publicada como separata do jornal “Vida Económica” de 31 de Julho, consta uma entrevista ao Director Geral da AIMMAP, Rafael Campos Pereira, na qual este responsável da associação sublinhou que o sector metalúrgico e metalomecânico deverá ser objecto dos mesmos incentivos e apoios que são concedidos aos outros sectores da economia nacional no sentido de fazerem face à situação de crise que atravessam.

Tendo em conta o interesse da matéria, transcreve-se a referida entrevista nas linhas subsequentes.

"1. Como está o sector metalúrgico e metalomecânico a reagir às dificuldades emergentes da actual situação de crise?
Como é sabido, este sector caracteriza-se desde logo pela sua grande heterogeneidade, abarcando uma multiplicidade de subsectores, cada um deles com lógicas, dinâmicas e características específicas. Por tal motivo, é muito difícil, numa análise global ao sector, formular um diagnóstico que seja susceptível de integrar o estado de todos esses subsectores.
Não obstante, pode assumir-se que, de uma forma geral, o nosso sector está a sentir dificuldades idênticas àquelas que os restantes sectores da indústria transformadora portuguesa estão a encontrar. Pelo que, naturalmente, reclama o mesmo tipo de atenção que seja concedida aos restantes sectores.
Sem prejuízo dessa avaliação mais genérica, deve sublinhar-se uma nota a respeito de alguns subsectores que se defrontam com dificuldades e constrangimentos acrescidos. São os casos em que os consumidores dos produtos finais recorrem ao crédito bancário para aquisição dos bens e produtos. Essa situação é especialmente característica do sector automóvel, dos materiais de construção e dos bens de equipamento. É que, como sabemos, a aquisição de automóveis, a compra de casas e a realização de investimentos nas fábricas estão dependentes na esmagadora maioria dos casos do acesso ao crédito bancário. Ora, como é sabido, entrámos num mundo que as restrições ao financiamento junto da banca são cada vez maiores. Pelo que baixou o consumo de automóveis e casas por parte das famílias bem como o investimento por parte das empresas. Compreende-se pois que os fabricantes de componentes para a indústria automóvel ou de ferramentas e máquinas para essa indústria, os fabricantes de materiais de construção e ainda os produtores de máquinas estejam a sentir dificuldades especiais. Pelo que, naturalmente, compreende-se que essas empresas reclamem um acompanhamento e uma compreensão por parte das autoridades públicas ainda mais especial.

2. Sugere com essa observação que a AIMMAP reclama a concessão de subsídios por parte do Estado para as suas empresas?
Nessas matérias deveremos ser especialmente criteriosos e sensatos. Além de que deveremos ser coerentes com os princípios e valores estruturantes que defendemos.
Nesse sentido, entendemos em primeiro lugar que qualquer intervenção excessiva do Estado na economia é prejudicial ao seu desenvolvimento saudável. Para além disso, somos absolutamente contrários a lógicas e culturas de subsídio-dependências. As empresas e os sectores devem beneficiar dos apoios públicos que merecem. E não falamos de apoios gratuitos ou inconsequentes mas sim de incentivos estruturados e que sejam compatíveis com a lógica da economia de mercado.

3. E então porque é que as empresas deste sector merecerão tais apoios?
Para quem conhece a evolução deste sector e do respectivo peso na economia nacional a resposta é absolutamente pacífica. Na verdade, este sector tem sido em Portugal, ao longo dos últimos anos, aquele que mais postos de trabalho cria e mantém, o que mais investimento tem gerado e o que contribui de forma mais significativa para as exportações nacionais.
Ao contrário de outros sectores da indústria transformadora portuguesa e europeia, as empresas metalúrgicas e metalomecânicas nacionais estão desde há muito expostas à concorrência global. E sem que nunca tenham beneficiado de protecções especiais por parte das autoridades nacionais ou comunitárias. Nomeadamente, defrontam-se com a concorrência dos fabricantes dos países asiáticos desde há muitos anos. As empresas portuguesas deste sector que sobreviveram ao impacto dessa concorrência, tantas vezes desleal, demonstraram uma enorme capacidade de resistência. Pelo que são na sua generalidade empresas de grande qualidade e até mesmo excelência que devem ser apoiadas em nome de princípios e valores mais amplos. Ou seja: se queremos manter uma economia competitiva importa apoiar os sectores que são mais competitivos em termos globais; se queremos combater o desemprego urge apoiar os sectores que tradicionalmente geram mais emprego em termos líquidos; e se queremos aumentar o investimento, é fundamental que se apoie os sectores que revelam maior capacidade de atracção a esse mesmo investimento, seja ele estrangeiro, seja ele nacional.
Pelo que, quaisquer incentivos ao sector metalúrgico e metalomecânico português traduzir-se-ão necessariamente em apoios a boas empresas que terão um retorno positivo para a economia nacional.

4. Referiu atrás que os incentivos a conceder aos sectores devem ser compatíveis com a lógica da economia de mercado. Quer concretizar?
Em primeiro lugar, numa observação genérica, há a referir o facto de os fundos públicos deverem ser geridos e distribuídos com grande prudência e parcimónia. Pelo que não podem ser investidos em poços sem fundo. Pelo contrário, como decorre do que atrás referi, devem privilegiar actividades em que haja retorno para o país.
Por outro lado, devem ser transparentes e produtivos, dentro de um quadro de normalidade e de respeito pelas regras da concorrência.
Assim, somos claramente a favor da implementação de medidas de apoio à manutenção do emprego, como é exemplo o actual Programa Qualificação e Emprego, no âmbito do qual, no pressuposto e na condição de que as empresas desenvolvam acções de formação dirigidas aos respectivos trabalhadores, há uma majoração da participação pública no pagamento das retribuições aos trabalhadores dessas mesmas empresas em processos de lay-off. Isto não obstante entendamos que há necessidade de o programa em causa ser ajustado e aperfeiçoado.
Defendemos igualmente que sejam criadas condições para que os bancos desenvolvam a implementação de linhas especiais de investimento nas quais as empresas possam financiar-se com maior agilidade.
Entendemos também que a actividade bancária e o relacionamento dos respectivos operadores com as empresas industriais devem ser objecto de rigoroso acompanhamento e supervisão, sancionando-se todos os comportamentos anómalos.
Consideramos por outro lado ser fundamental reforçar a capacidade exportadora das empresas com o mesmo tipo de incentivos de que os nossos concorrentes no exterior usufruem.
O investimento em investigação e desenvolvimento deve não só ser mais apoiado pelos organismos do Estado como também ser objecto de incentivos fiscais acrescidos.
O mesmo se diga relativamente à promoção do investimento na propriedade industrial, a qual se assume cada vez mais como um instrumento poderoso para reforço da competitividade das empresas.
Tem de ser especialmente reforçada a actividade de inspecção e fiscalização contra as práticas de contrafacção aos mais variados níveis.
Por outro lado, neste momento conjuntural de dificuldades acrescidas, deve ser considerada com seriedade a implementação de medidas fiscais de excepção que passem inclusivamente pela redução das taxas de IRC pelo menos nalguns subsectores mais afectados pela crise.
Estas e outras medidas têm como denominador comum o respeito pela lei e pelas regras do mercado. Pelo que, sem prejuízo de ser certo que algumas delas, mais ou menos atempadamente, foram lançadas ao longo deste últimos meses, importa no entanto aperfeiçoá-las estruturadamente.

5. De que forma deve esse aperfeiçoamento ser realizado?
Em primeiro lugar, melhorar o que já foi criado, nomeadamente no que se refere às medidas de protecção do emprego. Concretamente, o Programa Qualificação e Emprego deve ser ajustado no sentido de o expurgar de alguns constrangimentos à adesão de algumas empresas.
Em segundo lugar, reforçar a capacidade fiscalizadora do Estado nas mais diferentes áreas atrás referidas, desde a transparência na actividade bancária até à contrafacção.
Em terceiro lugar, revelar-se a coragem de introduzir melhorias na legislação fiscal.
Finalmente, assumir-se publicamente que os programas de apoio divulgados são extensíveis a todas as empresas e a todos os sectores. O que aliás é uma realidade incontornável.

6. Essa afirmação conflitua aparentemente com os programas lançados pelo Governo especificamente para apoio a determinados sectores.
Sinceramente, só na aparência é que tal contradição poderá ocorrer. Aliás, não faria sentido que um governo de um país em que a economia de mercado é uma realidade, privilegiasse injustificadamente alguns sectores de actividade em detrimento de outros.
Todos sabemos que assim é e o Governo também o sabe, naturalmente. Os programas de apoio específicos para alguns sectores que foram divulgados publicamente fazem parte, essencialmente, de uma lógica de marketing que deveremos compreender apenas como tal. Mas na prática são obviamente generalizados a todos os sectores de actividade. Basta ver que as linhas matriciais desses programas são precisamente o acesso ao Programa Qualificação e Emprego e às linhas PME Invest. Ora, como é sabido, as empresas do sector metalúrgico e metalomecânico beneficiam de tais medidas de apoio nos mesmos exactos termos em que as empresas dos outros sectores beneficiam – incluindo aí as dos sectores supostamente alvo de programas específicos. Aliás, nem outra coisa poderia suceder sob pena de cairmos no domínio do absurdo.

7. Em todo o caso, do ponto de vista mediático não seria preferível que o sector metalúrgico e metalomecânico beneficiasse também de um programa específico de apoio?
Pelo contrário, entendemos que é muito mais confortável para as nossas empresas que as mesmas não se encontrem estigmatizadas pelo suposto recebimento desses apoios de maior ou menor fachada.
Entendemos claramente que esse é um ónus a que as nossas empresas devem ser poupadas. Não queremos que a curto ou médio prazo as nossas empresas tenham de justificar algo que seria sempre verdadeiramente injustificável, ou seja, explicar o destino dado a algo jamais efectivamente recebido. Temos a convicção de que as nossas empresas, conforme muitas delas nos transmitem, estão em total conformidade com este entendimento."