segunda-feira, 9 de março de 2009

As empresas e os despedimentos

O Presidente da Direcção da AIMMAP, em artigo de opinião publicado no dia 6 de Março no jornal “Vida Económica”, regressou a um assunto que tem pontuado inúmeras intervenções públicas da AIMMAP nos últimos tempos, lastimando a forma pouco reflectida com que alguns dirigentes políticos e sindicais têm procurado atacar as empresas portuguesas.

Sendo certo que esta matéria se reveste da maior pertinência, transcreve-se neste blogue o artigo de opinião em causa.


"Demagogias e futilidades

Enquanto Presidente da Direcção da AIMMAP já tive em mais do que uma ocasião a oportunidade de me pronunciar sobre algumas afirmações irresponsáveis, proferidas por dirigentes sindicais, a propósito de despedimentos supostamente desnecessários efectuados por algumas empresas portuguesas, sob o pretexto da situação difícil atravessada pela economia nacional.
Putativamente, conforme foram qualificados pelos autores da acusação, tratar-se-ia de despedimentos “à boleia da crise”.
Como tenho dito, estas alegações não fazem qualquer sentido e traduzem um profundo desconhecimento daquilo que é a realidade das empresas portuguesas.
Começo por sublinhar que uma afirmação dessa natureza está irremediavelmente prejudicada por um vício de raciocínio completamente insanável. É que parece pressupor que apenas as empresas portuguesas têm despedido trabalhadores, quando basta ler os jornais para se concluir que, infelizmente, essa tendência é verdadeiramente universal. Em todo os cantos do globo, há cada vez mais empresas a sentirem-se obrigadas a reduzir os seus quadros de pessoal.
Mas acrescento ainda que, tais afirmações – que sendo generalizadas se transformam em atoardas -, estão igualmente inquinadas por preconceitos lamentáveis.
Ao contrário do que sugerem os mal intencionados, os empresários e gestores portugueses – como quaisquer outros, pelo menos, no continente europeu -, não têm qualquer gosto ou vontade de despedir os seus trabalhadores.
Enquanto empresários, a nossa principal vocação é a de empregar e não a de despedir. Para além disso, temos a consciência de que apenas com colaboradores motivados e leais, poderemos ter condições para dar à volta à crise nas nossas empresas.
A extinção de postos de trabalho será pois para todos nós o último recurso disponível. E tudo queremos fazer no sentido de manter connosco os nossos trabalhadores, os quais, na maioria das vezes, tanto nos empenhámos em formar e qualificar.
Não obstante o exposto, não se queira estigmatizar os empresários que acabam por recorrer aos despedimentos. Se o fazem é porque, como acima enfatizo, não têm outra opção. E em todo o caso, quando o fazem não estão a violar qualquer disposição legal ou sequer ética. Os despedimentos não só estão previstos na lei como podem ser uma inevitabilidade para muitas empresas que querem sobreviver e manter a generalidade dos postos de trabalho.
Não significa isto que, como já o assumi publicamente, não haja “maçãs podres” no nosso seio. Há-as seguramente como em todos os domínios da sociedade. Tal como acontece com os políticos, os advogados, os jornalistas, os sindicalistas ou os trabalhadores, também entre os empresários há os sérios e os menos sérios. Mas conforme sucederá certamente nas restantes áreas, também entre nós, empresários, os menos escrupulosos são seguramente uma minoria.
Pelo que ao invés de se tentar associar todos os empresários e gestores portugueses a práticas menos correctas por parte de uma pequena minoria, renovo o desafio às vozes da má lingua para que por uma vez tentem ser positivos e construtivos.
Estão no direito de apontar o dedo aos que prevaricam – e só a esses. Mas em contrapartida empenhem-se em reconhecer, também publicamente, as boas práticas de muitas empresas portuguesas que diariamente enfrentam as dificuldades que as assoberbam sem recorrerrem a despedimentos colectivos. Todos sabemos que são em muito maior número dos que as “maçãs podres”. E ficaria muito bem reconhecê-lo.
Até porque, quer queiram quer não, sem empresas a nossa economia jamais poderá ser viável.
Infelizmente, a má língua continua a ser uma arma muito mais fácil e é seguramente por isso que vamos continuar a ser ofendidos pela ignorância – ou atrevida ou maldosa.
Por falar em ignorância, lamento constatar que não são só os dirigentes sindicais a enveredar por esse tipo de condutas. Também alguns responsáveis políticos persistem em alhear-se das suas responsabilidades e lançar mão de afirmações gratuitas e inconsequentes. Tanto à esquerda como à direita.
Por um lado ouvimos dirigentes do Bloco de Esquerda ou do PCP a defenderem que pura e simplesmente se deveria proibir os despedimentos a empresas que hajam tido lucros no exercício anterior.
Isto é de uma leviandade aterradora. Afinal de contas, a que tipo de lucros se estão a referir? Será que é igual para tal efeito ter um lucro de um euro, de mil euros ou de um milhão de euros? E, para além disso, será que alguém pode afirmar seriamente que o facto de uma empresa ter beneficiado de lucros num determinado exercício lhe garante que no ano seguinte continuará a ter resultados positivos? Será que não aprenderam a lição com o que o aconteceu no final do ano passado em que empresas que haviam tido lucros no exercício de 2007 se virem confrontadas repentinamente com quebras de produção e de facturação na ordem dos 30%, dos 50% ou até dos 80%?
Lançar-se publicamente este tipo de “propostas”, para além de muito pouco sério, é evidenciador de preconceitos ainda menos dignos. Pelo que por ninguém deverão obviamente ser tidas em consideração. Até porque, para além do mais, são demonstrativas de total desconhecimento das leis que estão em vigor sobre essa matéria.
Inclusivamente, gostaria de chamar a atenção para o facto de as disposições legais que tutelam os despedimentos colectivos – e que foram objecto de consenso entre o Governo e os parceiros sociais –, terem como um dos seus principais pressupostos o de que o despedimento será admissível por motivos de mercado, ou seja, quando houver uma redução da actividade da empresa provocada pela dimunuição previsível da procura dos bens produzidos por aquela.
Concretamente, verifica-se que o legislador e os parceiros sociais tiveram em consideração a diminuição futura – previsível -, da procura dos bens produzidos pela empresa como causa eventual dos despedimentos colectivos. E muito bem o tiveram pois só assim se dota as empresas de condições para com rapidez poderem ajustar os seus quadros de pessoal e assim escaparem à insolvência. Só quem não quiser que as empresas sobrevivam pode contestar esta opção legislativa.
Como se não bastassem estas vacuidades à esquerda, também a direita nos surpreende com propostas que para além de demagógicas são fúteis.
Com efeito, o CDS-PP veio propor que as empresas que beneficiem de apoios do Estado deverão ficar impedidas de fazer despedimentos.
Mais uma vez a perplexidade nos terá de assolar. Afinal de contas, quais os tipos de apoios a que a “proposta” se refere? Benefícios fiscais? Incentivos às exportações? Apoios à contratação? Avales ao crédito? Estímulos à propriedade industrial e à I & D? O recurso ao lay-off? Ou a contratação de programas de qualificação-emprego?
E quais os despedimentos que passariam a ser proibidos? Despedimentos colectivos? Individuais? Extinção de postos de trabalho? Acordos de revogação?
Para além de não dar resposta a todas essas e muitas outras perguntas, a “proposta” do CDS tem subjacente um outro dado profundamente inquietante. É que, sendo tal a ânsia de apresentar propostas, nem sequer cuida previamente de tentar saber o que já está a ser feito.
Na verdade, é sabido que o Governo português já veio impor às empresas, no âmbito do pacote de medidas que entretanto aprovou para supostamente promover o emprego/combater o desemprego, as maiores restrições à cessação de contratos de trabalho.
Nalgumas delas – como por exemplo no caso do programa qualificação-emprego -, excluiu-se às empresas beneficiárias a possibilidade de recorrerem simultaneamente ao “lay-off” e de procederem a despedimentos colectivos até pelo menos ao final de 2009. E chegou-se ao cúmulo não só de as obrigar a manter o número de trabalhadores ao seu serviço como também, imagine-se, de as forçar a proceder à admissão de novos trabalhadores para substituição, até um determinado limite, de trabalhadores que se reformem ou que tomem a iniciativa de se despedir.
De uma forma geral, a obrigação de manutenção do número de postos de trabalho é o elemento estruturante de todas as medidas recentemente implementadas pelo governo português no sentido de supostamente ajudar as empresas a fazer face às dificuldades emergentes da crise.
Ora, esse é seguramente o ponto mais criticável em todo o pacote de medidas adoptadas pelo Governo.
Donde decorre que a “proposta” do CDS, para além de não consubstanciar novidade alguma e de ser ainda mais leviana e incompleta do ponto de vista conceptual que a do Governo, insiste naquele que é seguramente o maior erro do executivo.
Manifestamente, não há com quem possamos contar no sentido de apresentar soluções credíveis e articuladas para ajudar a economia portuguesa a ultrapassar a crise em que está envolvida.
Cada vez mais me convenço de que só podemos contar connosco. Com as empresas que continuamos a querer desenvolver e com as quais pretendemos persistir no objectivo de criar riqueza e valor para o país. E, obviamente, com os nossos trabalhadores a quem queremos continuar a assegurar o trabalho, com dignidade e segurança.
António Saraiva
Presidente da Direcção da AIMMAP"

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